Nos termos do art. 226 da CF/88, a família é a base da sociedade e tem especial proteção do Estado. Desta afirmação é possível retirar duas conclusões: a primeira é que, sem família não há sociedade; a segunda, a família deve ser protegida pelo Estado.
Ora, se a família é instituição necessária e sagrada para o desenvolvimento da sociedade, e se o casamento é instituto protegido pela Constituição, não pode a construção da unidade familiar resultar em maiores encargos fiscais para quem efetiva essa ordem jurídica.
Por esta razão, casamento e família devem ser estimulados com redução no pagamento de impostos e não como seu agravamento.
Exemplo claro surge quando se analisa o Imposto de Renda. Sabe-se que é imposto progressivo, no sentido de pagar mais quem ganha mais e menos quem ganha menos, além de se curvar aos princípios da capacidade contributiva, pessoalidade dos impostos, igualdade e vedação ao confisco, dentre outros.
Quando aplicado à unidade familiar, nos seus diversos ciclos, surgem observações importantes, como consequência das normas a ele aplicadas. No caminho natural da vida, e para cada etapa, o Direito Tributário incide de um modo peculiar, com o fim de aplicar a capacidade de pagar impostos com as peculiaridades do caso concreto.
Quando solteiro, a pessoa pode fazer a declaração completa ou a simplificada, o que demanda a primeira análise tributária, dado que, a depender do caso, é melhor valer-se do desconto simplificado de 20% da renda, com limites, a fazer a declaração completa com os descontos legais.
No convívio da vida familiar, a análise se volta para a diferença entre tributação conjunta e tributação separada. Na primeira, somam-se os rendimentos e as deduções do casal; na segunda, cada cônjuge é considerado individualmente. Nesse ponto, a legislação brasileira deixa a desejar, dado que em outros países, como EUA, Portugal, Alemanha e França, há o chamado “Splitting conjugal ou familiar”, em que as rendas são acumuladas, mas não são tributadas como se fossem uma unidade. Lá pode haver a divisão da renda pelos cônjuges ou também entre os filhos dependentes, o que reduz consideravelmente o montante de imposto a pagar.
Com a chegada dos filhos, surge o direito à dedução de dependentes, que hoje está na monta de R$ 2.275,08 anual ou R$ 189,59 mensal, o que é muito pouco. Com a criação dos filhos, surgem direitos de dedução da educação – limite anual de R$ 3.561,50 ou mensal de R$ 296,79 -, saúde (sem limite), pensão alimentícia, dentre outros.
Sobre a educação, há diversos pedidos no STF para que os limites de descontos previstos em lei sejam afastados pelo Judiciário, a fim de se efetivar o real direito ao desconto das despesas incorridas. O STF analisa o caso na ADI 4.927. Sobre pensão, o STF decidiu a não incidência do IR sobre os valores de pensões alimentícias decorrentes do direito de família.
Na hipótese de divórcio/separação, surge o cuidado para que não haja excesso de meação, gratuito ou oneroso, isso porque, em havendo, poderá surgir o dever de pagamento do ITIV ou do ITD.
Com o evento morte, surgem outras hipóteses de pagamento de tributos, com destaque para o ITCMD, a depender dos institutos aplicáveis, que podem se valer do inventário, testamento, seguro de vida, doação em vida – com ou sem reserva de usufruto -, holding patrimonial, dentre outros.
O seguro de vida tem sido opção utilizada pelas suas vantagens, dado que o beneficiário não paga Imposto de Renda, o capital não está sujeito às dívidas do falecido, não se submete ao inventário e não é necessário respeitar à legítima. O só fato de não ser considerado inventário o afasta do pagamento do ITCMD. Bom exemplo de seguro tem sido a aplicação conhecida como VGBL, em que os Tribunais têm afastado a incidência do ITCMD também nesses casos.
Enfim, diversos são os institutos jurídicos aplicáveis à família, do nascimento à morte, de sorte que deve o Estado ficar mais atento aos benefícios fiscais em cada etapa, a fim de que o Imposto de Renda não se afaste da proteção da família e da dignidade vital do contribuinte. Antes, deve servir de estímulo com progressivas reduções.
Se só há sociedade com família fortalecida, e se a sobrevivência da sociedade depende do surgimento de novas gerações, o tributo pode ser utilizado como instrumento de incentivo para a geração de famílias seguras e protegidas, tanto pelos pais como pelo Estado.
Harrison Leite, Advogado e Doutor em Direito Tributário