IGREJA E ATIVIDADE COMERCIAL

IMÓVEL DE IGREJA SÓ PERDE IMUNIDADE SE FISCO PROVAR ATIVIDADE COMERCIAL

A compra de imóveis de uma sociedade religiosa por outra não precisa pagar ITBI, nos termos do que dispõe o artigo 156, parágrafo 2º, inciso I, da Constituição, e do artigo 37 do Código Tributário Nacional (CTN). Os dispositivos descrevem a imunidade tributária de entidades religiosas. E, de acordo com decisão da 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, essa imunidade só pode ser afastada se ficar comprovado o objetivo comercial do negócio, no caso, a compra de imóveis.

Segundo o acórdão, a natureza e as finalidades sociais da entidade que impetrou o Mandado de Segurança, assim como da que foi extinta e da incorporadora, ficaram muito claras nos autos. Ou seja, ficou comprovado que ninguém se dedica a atividades comerciais, como compra e venda de imóveis ou direitos ou arrendamento mercantil, como era alegado pelo fisco do Município de Esteio (RS) nos autos.

A relatora da apelação no TJ, desembargadora Marilene Bonzanini, disse que, se os terrenos pertencem a uma entidade religiosa, presume-se que sejam afetos às suas finalidades essenciais. Não basta, para afastá-las, a mera conjectura da apelante de que não servirão às atividades religiosas. Segundo ela, “a imunidade, enquanto projeção dos direitos fundamentais do contribuinte, só deve ser afastada mediante prova contundente em sentido contrário produzida pela Fazenda”, registrou no acórdão.

Sentença procedente O pedido da entidade religiosa que incorporou os imóveis, de isenção do ITBI, foi deferido pela 3ª. Vara Cível da Comarca de Esteio. De acordo com a sentença da juíza Jocelaine Teixeira, “houve clara violação de direito líquido e certo” das igrejas. Ou seja, o fisco municipal não poderia requerer o recolhimento de ITBI.

Segundo a juíza, a imunidade fiscal de entidades religiosas é constitucional e cabe ao fisco demonstrar que as entidades que pretende autuar são comerciais. No caso concreto, registrou, sequer houve prévia oportunidade de defesa em relação aos argumentos trazidos pelos impetrados nas informações prestadas pela impetrante.

Processo n. 014/1.16.0006250-0

Fonte: Conjur

INCIDÊNCIA DE IR EM USO DE SOFTWARE

STJ MANTÉM DECISÃO QUE AFASTA INCIDÊNCIA DE IR EM USO DE SOFTWARE POR EMPRESA

De acordo com a Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça, reexame de prova é vedado em recurso especial. Com esse entendimento, a 1ª Turma manteve decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que afastou da Nestlé Brasil a obrigação de recolhimento do IR.

Em 2006, a empresa ajuizou ação contra a União com o objetivo de reconhecer que não existe relação jurídico-tributária que a obrigue a recolher o Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) sobre aquisição de licença de uso de softwares e/ou royalties ao exterior.

O juízo de primeiro grau afastou a obrigação de recolher a CIDE pela aquisição da licença, mas decidiu que o IR deveria ser retido. Ao analisar o caso, o TRF-3 considerou que o acordo firmado entre a Nestlé e o grupo estrangeiro fornecedor do software não implica contrato de transferência de tecnologia, mas sim mera licença de uso, aplicando-se ao caso o disposto no artigo 2º da Lei 10.168/2000.

Por não se tratar de produto desenvolvido especialmente para a empresa, de modo que a ferramenta poderia ser adquirida em qualquer prateleira, o TRF-3 entendeu não haver exploração de direitos autorais que permitisse a incidência do IRRF e da CIDE.

No STJ, o recurso interposto pela Fazenda pedindo a análise da incidência ou não de IRRF sobre remessas destinadas ao exterior para pagamento por software. Mas, de acordo com o ministro Gurgel de Faria, que teve o voto acompanhado pela maioria dos ministros, a conclusão de incidência ou não do imposto dependeria do reexame de prova, o que é vedado pela Súmula 7.

Ele ressaltou que corte regional também concluiu que não seria aplicável a Medida Provisória 2.159-70/2001, por inexistência de pagamento por suporte técnico. “As razões do recurso [da Fazenda] se limitam a defender a incidência do tributo ao só argumento de que os fatos geradores do IR ocorreram no Brasil”, completou o ministro.

Gurgel de Faria verificou também que, além da pretensão de reexame de prova proibida pela Súmula 7, não houve impugnação específica de fundamento adotado pela segunda instância, deficiência técnica descrita no enunciado da Súmula 283 do Supremo Tribunal Federal. O ministro citou, ainda, as Súmulas 282 e 284 do STF, que também seriam óbices para o conhecimento do recurso pelo STJ.

REsp 1.641.775

Fonte: Conjur

OPERAÇÕES DE CRÉDITO

EMPRESAS NÃO-FINANCEIRAS DEVEM PAGAR IOF SOBRE OPERAÇÕES DE CRÉDITO, DIZ CARF

Empresas não-financeiras devem pagar Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em operações de crédito correspondentes a mútuo, segundo decisão da 4ª Câmara da 1ª Turma Ordinária do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). A efetivação da cobrança ocorre na entrega total ou parcial do montante ou do valor que constituta objeto da obrigação, ou de sua colocação à disposição do interessado.

Por unanimidade, os conselheiros entenderam também que quando o pagamento não foi feito, o prazo de extinção do direito de a fazenda pública efetivar o lançamento começa a fluir a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele que poderia ter sido lançado, extinguindo-se cinco anos após esta data.

No voto, o relator, conselheiro Leonardo Ogassawara de Araújo Branco, afirmou que as operações de crédito correspondentes a mútuo de recursos financeiros entre pessoas jurídicas ou entre pessoa jurídica e pessoa física sujeitam-se à incidência do IOF segundo as mesmas normas aplicáveis às operações de financiamento e empréstimos praticadas pelas instituições financeiras.

“O Decreto nº 6.306/2007, que regulamenta o IOF, não deixa também qualquer dúvida de que as operações de crédito realizadas por pessoas jurídicas não financeiras estão também no campo de incidência desse tributo”, disse.

Para o relator, quanto ao mérito, o tributo analisado encontra disciplina no Decreto nº 6.306/2007 (RIOF), que preceitua a sua incidência em operações de crédito realizadas entre pessoas jurídicas.

“Devendo ser considerado o fato gerador a entrega do montante ou do valor que constitua o objeto da obrigação, ou sua colocação à disposição do interessado e o aspecto temporal de sua exteriorização a data da entrega, o momento de liberação de cada parcela, a data do adiantamento a depositante, assim considerado o saldo a descoberto em conta de depósito, a do registro efetuado em conta devedora por crédito liquidado no exterior ou da novação, composição, consolidação, confissão de dívida e assemelhados, ou do lançamento contábil em relação às operações e às transferências internas que não tenham classificação específica, mas que, pela sua natureza, se enquadrem como operações de crédito”, disse.

Formalização O entendimento foi fixado em um auto de infração que tinha como objetivo formalizar a cobrança de IOF. Segundo a autoridade fiscal, a contribuinte foi intimada a apresentar a lista de todos os contratos de mútuo em que a empresa figurasse como mutuante, para os anos de 2004, 2005 e 2006, bem como a declaração dos tipos de operações de crédito realizadas por meio de conta corrente, se com definição do valor de principal ou sem definição do valor de principal.

A contribuinte argumentou que não recolheu o IOF exigido por entender que este tributo não incide sobre mútuo realizado entre pessoas jurídicas coligadas e que não pode a legislação ordinária dispor de forma contrária à lei complementar e eleger outras hipóteses de incidências diversas das que são realizadas por pessoas jurídicas que não sejam instituições financeiras conforme previsto para os fatos geradores do IOF no artigo 63 do CTN.

Natureza Contratual O relator ainda defendeu que “não se está diante da questão acerca da natureza contratual subjacente à operação, questão esta que apenas aparece, de maneira inaugural, na instauração do contencioso, com a impugnação do auto lavrado”.

“Até este momento o que se verifica é que a empresa emprestava tratamento de crédito rotativo a tais recursos voltadas a financiar as contratantes, e, como tal, merece ser oferecido à tributação do IO/Crédito, com ancoramento positivo em lei”, explicou.

Fonte: Conjur

Crônica de uma crise anunciada

No dia 19 de dezembro de 2018, o presidente da República por um dia, Deputado Rodrigo Maia, sancionou a lei que flexibilizou as restrições para os Municípios que extrapolarem os gastos com pessoal. Trata-se da Lei Complementar n. 164, que alterou a Lei de Responsabilidade Fiscal, e suspendeu as penalidades impostas aos municípios que ultrapassem o limite de 54% da Receita Corrente Líquida com gastos de pessoal.

Aponte-se que a inobservância desse limite tem sido a maior causa de rejeição das contas municipais pelos órgãos de controle, no caso, os Tribunais de Contas.

Até então, ultrapassado o limite de 54% num quadrimestre, o Município tem dois quadrimestres para reduzir essas despesas ao limite, sendo que o não cumprimento impede o ente federativo de (i) receber transferências voluntárias; (ii) obter garantias de outro ente e (iii) realizar empréstimos, exceto para providências alusivas à redução das despesas com pessoal.

Com a nova lei, as três restrições acima não se aplicam ao Município, desde que haja queda de receita real superior a 10%, em comparação ao correspondente quadrimestre do exercício financeiro anterior, devido a (i) diminuição das transferências recebidas do Fundo de Participação dos Municípios decorrente de concessão de isenções tributárias pela União e (ii) diminuição das receitas recebidas de royalties e participações especiais.

Além de comprovar a redução da receita em 10%, oriunda das causas acima, o gestor também deverá provar que a despesa do quadrimestre vigente não ultrapassa o percentual de 54%, considerado, para este cálculo, a Receita Corrente Líquida do ano anterior atualizada monetariamente.

A lei não é “mil maravilhas”, como alguns estão pintando, e poucos municípios se adequarão aos requisitos cumulativos, que são três e vale a pena repetir: (i) redução da receita superior a 10%, em comparação ao correspondente quadrimestre do exercício financeiro anterior; (ii) a causa da redução deve se dar em decorrência, ou de isenções tributárias concedidas pela União, ou de diminuição da receita de royalties; e (iii) a despesa do quadrimestre analisado deve estar dentro dos limites, se observada a receita corrente líquida do ano anterior devidamente atualizada.

Muito criticado pela mídia, no sentido de flexibilização dos gastos municipais, ou de tolerância com irresponsabilidade fiscal, a lei aprovada, no entanto, nos chama atenção para um tema caro no discurso político: a análise das reais causas do elevado índice de gasto de pessoal, o custo desse gasto para o crescimento econômico do país e as propostas de solução do problema.

É certo que, diante do problema, o legislador prontamente se ergue para uma solução, mas esta deveria ser eficiente e duradoura, e não transitória, de curto prazo. Deveria atacar as causas e não transferir para outrem as responsabilidades.

Ora, receita de royalties, por ser temporária, nunca poderia ser aplicada em gasto de pessoal, e a lei expressamente o proíbe. Portanto, se cumprida a lei no nascedouro, a atual alteração, nesse ponto, não seria necessária. Igualmente, no atual cenário de crise, dificilmente a União dará benefícios fiscais no Imposto de Renda e no Imposto de Produtos Industrializados capazes de afetar drasticamente a perda de receita no importe de 10%.

Mas, e o real problema de gastos de pessoal, quando será enfrentado? Um país em que 14 Estados ultrapassaram os limites de gastos com pessoal em 2017, em que a União toma empréstimo de mais de R$ 150 bilhões para gastos com despesas primárias em 2018, aí incluindo pessoal, e em que um terço dos municípios não gera receita nem para pagar salário de prefeito, nos questionamos se será necessário esperar a crise piorar para se pensar em soluções.

No livro “Crônica de uma morte anunciada”, escrito por Gabriel García Marquez, todo mundo sabia que Santiago Nasar iria morrer, mas nada foi feito de concreto para proteger a vítima ou impedir os algozes. Todos deixavam para uma outra pessoa agir, até porque sempre havia a possibilidade de o pior não acontecer. Mas Santiago foi morto.

A crise fiscal está sendo anunciada há um bom tempo, desde 2009. Todos sabemos, mas fingimos desconhecer. Conhecemos as suas causas, mas deixamos sempre para  outro resolver o problema. Esquecemos que ele pode nos atingir.

Buscamos um culpado: ora é a receita que cai, ora é o valor dos royalties que diminui, ora é a política econômica interna ou externa. E nunca atacamos o gasto que persegue todas as gestões. E quando se propõe solução, o Supremo Tribunal Federal, que não sabe o que é crise financeira, dá a última palavra: as despesas de pessoal, além de imexíveis, podem inclusive ser majoradas.

Na crise anunciada e que atinge a todos nós, apenas de uma coisa devemos estar certos: a responsabilidade não é apenas do outro, é nossa também. E, em tempos como esse, a flexibilização não é a melhor solução. Santiago Nasar vai ser morto. Que o digam os Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

O momento é de aprimorar a eficiência no gasto público, mormente na área de pessoal, com redução dos seus custos. Para tanto, o art. 169 da Constituição Federal apresenta três soluções: (i) redução de gastos cargos em comissão e funções de confiança; (ii) exoneração de servidores não estáveis e (iii) exoneração de servidores estáveis.

Sem entrar em detalhes no procedimento para esta redução e nos seus requisitos, outros estudos podem ser feitos: (i) elaboração ou revisão de planos de carreira que realmente avaliem e valorizem a qualidade do serviço público prestado; (ii) avaliações periódicas do trabalho desenvolvido pelo servidor, para evitar progressões automáticas; (iii) análise dos acréscimos pecuniários concedidos, para que não sejam computados nem acumulados para fins de concessão de acréscimos ulteriores (art. 37, XIV da Constituição Federal); (iv) estudo das hipóteses de vacância do cargo, que incluem a aposentadoria, dado que o Regime Geral de Previdência Social é o Regime do Município quando não há regime próprio; (v) limitações de ganhos com tetos razoáveis; (vi) incentivos a planos de demissão voluntária; (vii) auditorias em folha, para evitar acumulação proibida em lei e retirar acréscimos sem previsão legal; (viii) retorno à carga horária aprovada em concurso, quando diminuída no passado, como forma de evitar novas contratações; (ix) análise do impacto financeiro-orçamentário na concessão de qualquer despesa de natureza continuada, nos termos do art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal; e (x) estudo dos encargos que incidem sobre a folha, pois alguns deles são computados erroneamente, como se dá com a base de cálculo (salário de contribuição) para fins de pagamento do INSS patronal e a correta alíquota do Seguro Acidente de Trabalho (SAT).

Sem estudo sério dessa despesa, os gestores tendem a se preocupar mais com folha de pagamento do que com planejamento e realização de políticas públicas. E quando esse é o foco, não se faz política.

É chegada a hora de resolvermos esse problema e tal se dará através de instrumentos elaborados por estadistas, através da política. Sem essa solução surgirão desânimo e a sensação de que os problemas são insolúveis,  afastando os gestores atuais da nobre missão e inibirão novos nomes no cenário nacional.

Harrison Leite