PRINCÍPIOS E GARANTIAS TRIBUTÁRIOS

Imunidade tributária e contribuinte de fato

A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante, para a verificação da existência do beneplácito constitucional, a repercussão econômica do tributo envolvido.

Com base nessa orientação, o Tribunal deu provimento ao recurso extraordinário no qual se pretendia a não aplicação da imunidade tributária constante do art. 150, VI, “c”, da CF relativamente ao ICMS incidente na aquisição de insumos, medicamentos e serviços adquiridos por entidade de assistência social na qualidade de consumidora (contribuinte de fato).

Na espécie, o Tribunal de origem afastou a exigência do recolhimento do ICMS nas operações de aquisição, por entidade de assistência social (na qualidade de consumidor final), de medicamentos, máquinas e equipamentos necessários à execução de suas finalidades filantrópicas, ante a configuração da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, “c”, da CF.

Para o recorrente, a aquisição de insumos e produtos no mercado interno na qualidade de contribuinte de fato não estaria albergada pela imunidade tributária prevista no art. 150, VI e § 4º, da CF. Além disso, ressaltou que a jurisprudência do STF vem se posicionando pela impossibilidade de se estender ao particular vendedor (contribuinte de direito) a imunidade tributária subjetiva que detém o adquirente de mercadoria (contribuinte de fato).

Assim, o beneficiário da imunidade tributária subjetiva na posição de simples contribuinte de fato, embora possa arcar com os ônus financeiros dos impostos envolvidos nas compras de mercadorias, caso tenham sido transladados pelo vendedor contribuinte de direito, desembolsa importe que juridicamente não se qualifica como tributo, mas sim preço, decorrente de uma relação contratual.

Asseverou, por fim, que a temática da repercussão econômica tributária está na área de formação dos preços e que, apenas com substancioso estudo dos fatores e das circunstâncias (como condições de tempo, lugar e conjectura econômica), seria possível verificar, num juízo de relativa previsibilidade, a provável repercussão econômica do tributo. Ponderou, dessa forma, ser desaconselhável considerar a denominada repercussão econômica do tributo para verificar a existência ou não da imunidade tributária. Essa orientação, a propósito, alinha-se aos precedentes da Corte no sentido de ser a imunidade tributária subjetiva constante do art. 150, VI, “c”, da CF aplicável à hipótese de importação de mercadorias pelas entidades de assistência social para uso ou consumo próprio. Com efeito, essas entidades ostentam, nessa situação, a posição de contribuintes de direito, o que é suficiente para o reconhecimento da imunidade.

 (Informativo 855, Plenário, Repercussão Geral)

Fonte: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoInformativoTema/anexo/Informativomensalfevereiro2017.pdf

REGIME TRIBUTÁRIO

Redução da base de cálculo do ICMS e estorno de créditos

A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, deu provimento a agravo regimental em que se pretendia o estorno total dos créditos do ICMS gerados na entrada de insumos tributados, na hipótese de o contribuinte exercer a opção pela tributação com redução da base de cálculo na saída das mercadorias.

No caso, norma estadual instituiu regime tributário opcional a empresas transportadoras contribuintes do ICMS. Com isso, ficava facultada ao contribuinte a manutenção do regime normal de crédito e débito do imposto ou a apuração do débito com o benefício da redução da base de cálculo, vedada, nesta hipótese, a utilização de quaisquer créditos relativos a entradas tributadas.

O Colegiado entendeu que, havendo a opção pelo regime ordinário ou por regime mais favorável de tributação e estabelecendo a lei um regramento específico para o regime mais favorável, a adesão a ele não gera o direito ao creditamento se a lei o excluir. Assim, o contribuinte deve optar por um dos regimes.

AI 765420 AgR-segundo/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgamento em 21.2.2017. (AI-765420)

(Informativo 855, 1ª Turma)

Fonte: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoInformativoTema/anexo/Informativomensalfevereiro2017.pdf

PIS E COFINS

A não incidência do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS – Justiça Tributária e a Aberrante Modulação dos Efeitos prospectiva pretendida pelo Fisco

O Supremo Tribunal Federal decidiu no último 15 de março que o ICMS, uma vez que não compõe o faturamento ou a receita bruta das empresas, deve ser afastado da base de cálculo do PIS e da COFINS. O julgamento, por 6 votos a 4, representou um avanço no entendimento da Corte em prol dos contribuintes.

O Ministro Celso de Melo afirmou que “Se a lei pudesse chamar de faturamento o que faturamento não é, e a toda evidência empresas não faturam ICMS, cairia por terra o rígido esquema de proteção ao contribuinte traçado pela Constituição”, disse o ministro Celso “Se a lei pudesse chamar de faturamento o que faturamento não é, e a toda evidência empresas não faturam ICMS, cairia por terra o rígido esquema de proteção ao contribuinte traçado pela Constituição”

A Cofins financia a Seguridade Social. Já o PIS serve para financiar o pagamento do abono salarial e seguro-desemprego. Questão interessante e que ainda repercutirá nos plenários da Corte trata-se da modulação dos efeitos do referido precedente. Não havia pedido formal no processo de modulação de efeitos da decisão. Na sessão do dia 9, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional sustentou que os efeitos da decisão fossem modulados para 2018. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio chamou a ideia de “extravagante”. “Um pedido de modulação de forma prospectiva”, avaliou o vice-decano. Na sessão desta quarta, ao encerrar o julgamento, a ministra Cármen explicou que não se vota a modulação quando inexiste o pleito, mas que os ministros poderão se pronunciar caso seja feita essa petição posteriormente.

Com o entendimento cristalizado no decisum, segundo a PGFN a União deixará de arrecadar R$ 250 bilhões.

Referido julgado não deve ser analisado isoladamente. Se considerado seus fundamentos de forma ampla, numa visão sistêmica, o alcance do julgado tem o condão de alterar sobremaneira o sistema tributário nacional, de forma a alinhar a tributação praticada no Brasil com a praticada no resto do mundo. Isto porque, ao firmar o entendimento de que o ICMS não deve compor a base de cálculo do PIS e da COFINS, trocando em miúdos, o STF nada mais disse do que “não se cobra tributo sobre tributos”.

Tal entendimento tende a balançar todo o sistema tributário brasileiro, marcado pela tributação sobreposta. Esperemos, pois, pelos próximos capítulos.

Segundo a RF, bens que sofrem desgaste no processo de fabricação geram crédito para o PIS/COFINS

De acordo com a Solução de Consulta nº 99.047/2017 (DOU de 22/03) da Receita Federal, consideram-se insumos, para fins de creditamento das contribuições de que trata o art. 3º, inciso II das Leis nº 10.637 de 2002 e Lei nº 10.833/2003, entre outros, bens que sofram alterações, tais como o desgaste, o dano ou a perda de propriedades físicas ou químicas, em função da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação, sendo desnecessário que venham a compor o produto final.

Para tanto, os bens mencionados não podem estar incluídos no ativo imobilizado e devem, ainda, atender todos os demais requisitos da legislação em vigor.

Como exemplo, as lixas abrasivas, brocas para furadeiras, disco de corte e gás para máquina de solda são considerados insumos que se desgastam durante o processo produtivo, portanto geram crédito de PIS e COFINS.

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NÃO DEPENDE DE COMPROVAÇÃO DE DANO PROCESSUAL

À primeira vista, pode parecer que a aplicação da multa por litigância de má-fé depende de comprovação da ocorrência de algum dano processual à parte ex adversa. Não é esse o entendimento da Terceira Turma do STJ. Vejamos:

O Banco do Brasil havia sido condenado a pagar indenização e questionou a fixação dos honorários advocatícios, impugnando a execução da sentença, para tentar diminuir o valor, que já atingia mais de 3 milhões de reais.

Após manejar alguns recursos perante o TJMG, o referido Tribunal entendeu que, ao tentar escusar-se da execução da sentença através de uns tantos incidentes processuais, o Banco do Brasil estaria praticando litigância de má-fé, em afronta ao art. 17, do CPC/1973.

Inconformado, o Banco do Brasil bateu às portas do STJ, interpondo o REsp n. 1628065, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, que votou favoravelmente à pretensão recursal, mas o Min. Paulo de Tarso Sanseverino abriu a divergência, votando no sentido de que a multa por litigância de má-fé prescinde da demonstração de dano processual, e foi seguido pelos ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro.

 

Fundamento do voto vencedor e a reafirmação da litigância de má-fé como ofensa à dignidade de Justiça

O Banco do Brasil questionava, perante o STJ, a aplicação da multa por litigância de má-fé, sob o fundamento de que não teria havido dano processual à outra parte. Rechaçando tal argumento, o Min. Paulo de Tarso asseverou que a comprovação de dano processual é fundamental nos casos em que a parte busca uma indenização por perdas e danos, não no caso de multa por litigância de má-fé.

Nos casos de litigância de má-fé, a multa aplicada tem função de sanção processual, não de indenização à parte contrária, de modo que “não exige comprovação inequívoca da ocorrência do dano”.

Decidindo assim, vê-se o STJ reafirma que a litigância de má-fé não é punida em razão da ofensa individualmente feita à parte contrária, mas em razão de violar a dignidade da Justiça, que não pode ser alvo de chicanas jurídicas. Visa-se à proteção, sobretudo, da Justiça, e, apenas em segundo plano, dos interesses das partes.

O CRIME DE EXTORSÃO

O crime de extorsão pode ser cometido através de “ameaça espiritual”, decidiu o STJ

 

Conheça o caso:

Em São Paulo, a vítima contratou serviços da acusada, Priscila Estephanovichil, para que esta realizasse trabalhos espirituais de cura, aqueles popularmente chamados de macumba. Então, a ré teria induzido a vítima a erro e obtido vantagens financeiras de mais de 15 mil reais, tudo através de atos de curandeirismo.

Contudo, a partir do momento em que a vítima passou a se recusar a dar-lhe mais dinheiro, a ré começou a proferir ameaças, e, conforme a denúncia, teria pedido R$ 32 mil para desfazer “alguma coisa enterrada no cemitério” contra os filhos da vítima.

A ré foi condenada e após os recursos interpostos na instância ordinária (o TJSP), o processo foi submetido ao STJ, através do Recurso Especial 1299021 (REsp 1299021), tendo como principais alegações a ausência de eficácia da ameaça espiritual enquanto meio para o cometimento da extorsão (ineficácia absoluta do meio) e a desclassificação do crime de extorsão para o crime de curandeirismo. Pretendendo uma pena mais branda (a do crime de curandeirismo – de 6 meses a 2 anos), Priscila alegou que “agiu com o intuito de, com fórmulas e rituais, resolver os problemas de saúde suportados pela vítima, praticando, em verdade, o crime de curandeirismo”, não o de extorsão, cuja pena é de 4 a 10 anos de reclusão, e multa.

A decisão do STJ:

Em 14/02/2017, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça conheceu em parte o Recurso Especial interposto por Priscila Estephanovichil, mas no mérito negou-lhe provimento, sob os seguintes fundamentos: 1) a alegação de ineficácia absoluta da grave ameaça de mal espiritual não poderia ser acolhida, uma vez que a vítima, em razão de sua livre crença religiosa, acreditou que a recorrente poderia concretizar as intimidações de “acabar com sua vida”, com seu carro e de provocar graves danos aos seus filhos e, por isso, estando coagida, realizou o pagamento de indevida vantagem econômica, aquela exigida por Priscila. 2) o Tribunal de origem concluiu que a recorrente Priscila, desde o início, valeu-se da liberdade de crença da vítima e de sua fragilidade para obter vantagem patrimonial indevida, não sendo caso de curandeirismo, mas de extorsão, de modo que, por força da súmula 7, o STJ entendeu inviável reverter o entendimento da Corte Estadual de Justiça.

A decisão como um marco para a limitação ao abuso da liberdade de culto:

Como se sabe, a Constituição Federal, em seu art. 5º, inc. VI, assegurou que é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. Porém, tem sido recorrentes os casos de lideranças religiosas – sejam elas católicas, protestantes ou candomblecistas – que se valem da fé e da inocência dos fiéis para obterem vantagens econômicas, explorando-os financeiramente através de apelos de doações “em troca de bênçãos”.

Embora o caso julgado pelo STJ tenha se referido especificamente ao uso de ameaças de cunho espiritual, no sentido de constranger a vítima para que ela fornecesse vantagem econômica indevida (crime de extorsão), entendemos que esse é um marco jurisprudencial mais amplo, por sinalizar que é possível a intervenção do Estado-juiz naqueles casos em que, a pretexto de liberdade de crença, as lideranças religiosas abusem desse direito para causar prejuízos a pessoas que estejam vulneráveis em razão da livre crença religiosa, expondo-se a constrangimentos voltados à exploração financeira para se obter vantagens indevidas.

 

Fonte:

https://www.stj.jus.br/